domingo, 16 de junho de 2019

Meu conforto é saber que você sabia o quanto eu te amava.

Se tem uma coisa que mexe comigo, que na mesma hora vem lágrimas aos olhos, um nó na garganta e uma vontade quase que incontrolável de vomitar, é lembrar do sofrimento que eu não pude te poupar. Ver teus olhos perdidos na imensidão dos pixels, da tela da TV... olhando sem enxergar, absorto em pensamentos que não sei onde te levavam... um misto de desalento e parcimônia. Eu pegava a tua mão e perguntava: meu irmão, quer falar alguma coisa? o que eu posso fazer pra te ajudar? E você me olhava com os olhinhos azuis, amarelados pela doença, tristonhos e cabisbaixos e respondia: "tá tudo bem minha irmã, tá tudo certo". E na verdade, a gente sabia que não estava tudo bem, a gente sabia que não estava tudo certo. Estava tudo muito, muito errado, e eu não sabia o que fazer para amenizar aquele desespero mudo, contido. Chorar ali não era viável, eu não podia... você não queria. A gente engolia o choro, a angústia e eu te abraçava, te mudava de posição, pegava em sua mão e fazia a oração mais cheia de sentimento que eu podia. Pedia forças... pra você, Waltinho, pra mim, pra nossa mãe. Pedia a Nossa Senhora, a Deus... Aqueles momentos ainda latejam dentro de mim, como se fosse hoje. O Câncer é uma doença que maltrata. Vai matando aos poucos, o doente e à família que se desespera sem nada poder fazer. Como eu queria tirar essa coisa ruim de você, meu irmão! Aquela sensação ainda vibra como a dor mais lancinante que eu já senti... Sinto, re-sinto, cada vez que me projeto naquele quarto de hospital, aquele sentimento... Era excruciante... e olha que ali, ainda estávamos em uma UTI "humanizada", onde eu e nossa mãe, ainda podíamos cuidar de você, e manter distância dos cães ferozes que rondavam aquele recinto, prontos pra te levar ao abate. Eu nunca vou esquecer aqueles momentos, Waltinho. Pode passar o tempo que for, a mesma sensação horrorosa vai tomar conta de mim, e lágrimas pesadas e quentes vão rolar no meu rosto, o nó enoooorme na garganta vai impedir o ar de circular, e vou engolir o vômito. Vai doer todo o meu corpo e minha alma. Na próxima lembrança, vou tentar relembrar apenas o grande amor que eu sinto por você, meu irmão. Vou lembrar do carinho que eu te cuidava, das vezes que eu te levantava para sair da cama, sentar na cadeira, sair da cadeira, voltar pra cama... e nada daquilo ali me cansava. Nada daquilo conseguia acabar com o amor que eu sentia naqueles momentos. Muito pelo contrário. Eu pude sentir o amor mais puro que pude conhecer. Cuidava de você, como se você o filho que nunca tive. Graças a Deus eu tive a oportunidade de cuidar de você, meu irmãozinho. Foram aqueles dias no hospital, que foram muito duros... marcaram com fogo o meu peito. Mesmo no meio daquela dor de alma, eu pude dizer o quanto eu te amava, pude cuidar de ti, dar o melhor que eu podia, pra você. Dei muitos abraços, sentia o cheirinho do seu cabelo, o quentinho da sua mão. E de vez em quando eu conseguia tirar um sorriso dos seus lábios, com alguma brincadeira ou algum causo de nossa infância, que eu te relembrava. Eu sinto muito a sua falta. Me dói demais lembrar esses momentos. Preciso expurgar essa dor, preciso conviver com tudo isso, Waltinho. É tudo tão estranho, sinto dor, muita dor. Se eu pudesse, eu trocaria de lugar com você, meu irmãozinho, ver você ali, marcou demais, dói todos os dias, de forma ininterrupta. Nada faz passar isso que eu sinto. O tempo não ameniza, não apaga. Meu conforto é saber que você sabia o quanto eu te amava. Graças a Deus, você sabia o quanto era e é importante pra mim. Meu bebê, meu manequinho, meu maior tesouro, minha melhor herança e a melhor parte de mim. Você vive vivo em mim. Te amo para sempre, meu irmão.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe aqui sua mensagem