quarta-feira, 3 de maio de 2017

Quanta Saudade - parte 2 - Walter Sieczko

O tempo é tão implacável, meu irmão.
Tão inexorável como a certeza do dia e da noite. Haja o que houver, seja lá o que acontecer, todos os dias vemos o sol nascer e se pôr. Assim chega a noite e nasce novamente o dia. O tempo não pára, não volta! A quem é dotado de boa memória, cabe em si o reviver de suas lembranças... mas até isso o tempo é capaz de apagar. Ao longo do tempo, vamos perdendo os detalhes dos anos passados, e findos as conclusões dos nossos caminhos, vamos perdendo através deles as melhores lembranças da nossa existência, uma herdade que nos é tirada, com a proximidade da finitude da vida. Mas, previamente sábia quanto a isso, recupero no fundo das minhas recordações, cada momento vivido. Fica mais fácil com as imagens... fotos... fotografias tão antigas, mas que trazem à tona toda reminiscência presente, ainda que esquecida em algum cantinho da mente. Uma prova viva da minha história contada; um cenário versado em atos... ato 1, ato 2 e assim por diante, vamos  produzindo o nosso filme de vida particular. Você, Waltinho, é personagem principal na minha história. Mesmo você tendo partido para o outro lado da vida, continua sendo a célula principal da minha narrativa. E vai continuar sendo, porque, sendo irmão, sendo família e família sendo o centro do mistério da vida, você faz parte de mim, assim como ainda faço parte de você. Existimos porque nascemos. Temos pai e mãe. Somos filhos, Victor também se torna irmão, e porque não, também dizer, filho de nossa mãe, que também sente amor por ele. Afinal, filho não é apenas filho nascido. Filho se torna filho quando é amado. Então eu também te sinto meu filho, já que também criei você de certa forma. Com o divórcio, nossa mãe virou pai, eu virei mãe e você virou filho. Além de meu primeiro amigo, além de ser meu maior tesouro, a melhor herança que meus pais poderiam ter deixado pra mim, você ainda é a melhor parte de mim, porque eu sou você, e você sou eu. Victor tem parte de nós dois. Uma conjunção de vidas, corpos, espíritos e sentimentos. Eu não trocaria esse amor por nada nessa vida. Então eu retorno às minhas lembranças... bem devagarzinho, porque tenho medo que elas possam enfraquecer, mas em contrapartida, recupero na memória tudo que possa me lembrar de momentos vividos com você. Faço um catálogo mental... mas preciso também escrever, preciso da minuciosidade dos fatos, recorro à mente, e também as caixas e gavetas de fotos. Nada pode se perder... assim como uma foto mal tirada, desfocada, não interessa... naquela época, não haviam mais de 36 poses por carrete de filme. Tudo me é aproveitado, tudo é sentido. Penso no fato, volto no tempo... ahhhhh, o tempo... ele ainda não é capaz de me fazer esquecer, Waltinho... O tempo passa, sim, ele passa... o tempo não volta, sim, ele não volta... mas o tempo ainda não me fez esquecer as lembranças da minha infância e de todo o tempo que tivemos vivendo na mesma casa, com nossa mãe... até que nossas escolhas da vida adulta nos afastasse fisicamente. Mas nunca efetivamente. Então, quem dá uma rasteira no tempo agora sou eu. Eu, Andreia Sieczko, irmã mais velha do Waltinho e do Victor Hugo. Eu mesma... escrevo e vou continuar escrevendo tudo que eu tiver de lembrança armazenada na cabeça e no meu coração. Talvez algum dia eu perca a capacidade de recordar, mas e daí? Tá aqui, tá escrito... a não ser que a internet se acabe, nossa história estará na web pra quem quiser conhecer a nossa história. Nem tão feliz, nem tão perfeita, mas ainda assim a nossa história. Temos nossa história vivida e aqui recontada, para que nunca, nem jamais seja esquecida. Aí onde você está tem internet? Ás vezes penso que você está lendo tudo que escrevo... mas aí eu recordo que você nunca parou pra ler nada. Seu preguicinha! Escute pelo menos o que vou dizendo, enquanto vou escrevendo... Ó, presta atenção, bisonho... Eu penso até que onde você está vivendo agora, deve ser muito mais maneiro em relação à tecnologia... acho que você é capaz de rever esse filme, todos esses capítulos da história da nossa vida aqui na Terra. É maneiro, meu irmão? Estou contando nossa história direitinho? Era assim que você também lembrava? Lembra ainda desse dia aqui nesse clube bacana? Olha lá em cima, você e nossa mãe, toda novinha... nessa foto minha mãe tem quase idade de ser minha filha... hoje tenho 45, na foto sua mãe deveria ter uns 28, 29... quase eu poderia ser sua avó... Putz... conversa de doido, né??? Mas o tempo é capaz de fazer essas doideiras... dizem que aí onde você mora agora, o tempo é bem diferente do que esse tempo aqui vivido na Terra. Eu não consigo entender nem o tempo daqui... imagina o daí.
Eu me recordo bem desse dia, conforme já escrevi em outra postagem... fecho os olhos e sinto até o gosto do cloro arranhando na minha garganta, quando pulamos na piscina funda e você ficou apoiado nos meus ombros, kkkkkkkkkkk. E o cheiro de cloro está aqui, ó... bem no meu nariz... ainda, depois tantos anos... ahhh, o tempo... mesmo sendo tão inflexível, não consegue apagar de mim, essas memórias. E isso tudo, Waltinho, me faz um bem danado. Não me faz sofrer mais do que já sofro por sua ausência... Aliás, que ausência? Se você está tão vivo dentro do meu coração???? Tô ficando louca? Será? E daí? Pouco me importo com a opinião das pessoas. Elas talvez, ainda não saibam o que é amar incondicionalmente um irmão. Não desejo que ninguém sinta essa falta que alguém que se ama, e se perde, faz.
Olha aí, você dando uma super barrigada de impulso com a perna esquerda, afinal, você é canhoto...  Menos mal que já está na parte rasa da piscina grande... ali você "dava pé". Preciso procurar as outras fotos desse dia... as fotos estão soltas na gaveta de álbuns e fotos. Boa oportunidade de colocar em ordem nossas lembranças. É isso, meu irmão... esse foi o filminho de hoje, pra nós relembrarmos desse dia. Mas se você ver que esqueci algum detalhe, você me avisa? Me manda um sinal de fumaça? Me manda esse filminho também... tenho algumas horas de sono pra fazer o download  e assistir com você. Preparo a pipoca e o seu biscoito de limão preferido, tá? Deixo você comer a minha caixa de bombom, e nem vou brigar com você por isso. Venha em sonho, venha como você puder, mas não me deixe sem me dar um feedback. E o mais importante de tudo, nunca se esqueça que você é muito amado, tá?

Andreia Sieczko
Irmã do Walter e do Victor.

Um comentário:

  1. Como sempre, maravilhosa. As palavras fluem. O texto se solidifica e, ao mesmo tempo, se esvai em energias que penetra fundo em nosso coração. Em nossa alma. Já li outros textos seus. também te conheço há muito tempo e conheci Waltinho também. Chegamos a brincar juntos algumas vezes. Não tem como não se emocionar. Parabéns Andreiazinha. parabéns querido espírito de luz!
    Delfim Moreira

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